Maureen estava apavorada. Por que, em nome da Deusa, tinha aceitado participar daquela aposta estúpida? A culpa era dos seus hormônios. Por que quis mostrar que era corajosa para Jack, quando essa era última coisa que ela era? Tinha medo de baratas, tinha medo de escuro, tinha medo de fantasmas. Tinha medo de tudo, se fosse bem honesta.
Continuou caminhando em direção ao casarão enquanto repetia para si mesma:
- Estúpida, estúpida, estúpida...
O caminho não era longo. Abriu a mochila e conferiu o conteúdo. Não podia esquecer de nada. Suava de nervoso e pelo esforço. Sua avó havia lhe explicado sua linhagem, mas não achava que seria jogada assim no seu primeiro ritual despreparada e motivada por uma aposta idiota.
- De qualquer maneira, deve trazer alguma boa sorte debutar na magia em pleno Halloween.
Aproximou-se cautelosamente do portão da mansão abandonada. Espiou os arredores, e entrou tentando fazer o mínimo de ruído possível. Encaminhou-se apressadamente até a porta principal, girou a maçaneta que estava, obviamente, emperrada.
- Legal. Porque sempre tem que ser do jeito mais difícil?
Começou a rodear o casarão. Nada, nenhuma brecha. Já estava quase voltando para perto dos outros com o gosto amargo da derrota na boca quando notou uma janela batendo ao ritmo do vento. Empurrou-a sem sentir nenhuma resistência, colocou as mãos no parapeito da janela e içou seu corpo miúdo para cima e para dentro com a fluidez de um gato. Parou por um momento para ajustar os olhos à pouca luz que entrava pelos vidros sujos das janelas do que parecia ser a sala de jantar. Todos os móveis estavam cobertos por uma grossa camada de pó. Pegou a lanterna na bolsa para poder enxergar melhor. Olhando pela porta do cômodo, viu uma escada e sentiu uma estranha necessidade de realizar seu ritual no andar superior, simplesmente sentia que era o correto a ser feito. Subiu os degraus de dois em dois, ansiosa por chegar e encontrar nem ela sabia o que. Como sua avó sempre lhe dizia:
- Quando você encontrar, saberá que encontrou e parará de procurar. Sua alma eterna sabe mais do que seu cérebro terreno.
Gostaria que sua avó estivesse ali com ela e não num asilo, onde seus pais a haviam internado a força. Mas não era o momento de pensar nisto. Passava pelo corredor e via as portas fechadas. Não sentia nada especial por nenhuma delas. Já estava quase passando direto pela terceira porta quando estacou, a respiração presa na garganta. Era ali, podia experimentar uma vibração na pele. Estendeu a mão para a maçaneta redonda de ferro polido. Ela estava quente e pulsante entre os dedos. A magia envolvia aquele aposento. Girou-a e entrou, deparando-se com um ambiente limpo e arejado, com um altar repleto de objetos mágicos, onde se destacavam um polido caldeirão, uma adaga reluzente e alguns cristais que emanavam uma luz turva. Respirou fundo. Como pôde ficar tanto tempo longe deste lugar? Passava todo dia por aqueles portões para ir ao colégio e nunca havia percebido aquela intensa força que parecia puxá-la para mais perto.
Ajoelhou-se perante o altar, reverenciando-o.
-Abençoado seja. - murmurou em reverência.
Abriu a mochila que carregava consigo e pegou os fósforos para acender o fogo embaixo do caldeirão. Seus dedos tremiam e foram necessários três tentativas até conseguir seu intento. Pegou uma garrafa de água que estava na mochila e derramou seu conteúdo dentro do caldeirão. Sentou-se pacientemente para esperar a água iniciar fervura. Concentrou-se. Entrou em contato com a sua Deusa interior, com a Natureza, com o principio de tudo. Sentia-se energizada e poderosa. Não era mais a menina medrosa do início da noite. Agora era a grande Mãe, a Deusa, a beleza personificada. Não havia nada que não estivesse ao seu alcance. Levantou-se. O poder pulsava em cada célula do seu corpo. A água já estava fervendo, era mais do que hora de começar o ritual. Foi pegando os ingredientes um a um e jogando-os dentro do caldeirão. Flores frescas de mil folhas, pêlos de um cão de caça, algumas gotas de essência de rosas e de orvalho, uma pedra ametista e o anel de Jack. Suspirou ao pensar nele. Teria-o finalmente. A cada ingrediente lançado nas águas turvas do caldeirão, ela repetia as palavras de poder.
- Ó Lua senhora de todos os amantes, traz-me um amor encantado. Que ele chegue o quanto antes. Por mim perdidamente apaixonado!

Ao finalizar o ritual, apagou o fogo e caminhou com o caldeirão até a varanda do quarto, colocando-o para receber o sereno da lua. Murmurou:
- Que seja para o bem de todos!
E começou a afastar-se com reverência, pronta para pegar a câmera fotográfica na bolsa para registrar aquele momento, quando sentiu uma mão em seu ombro. Assustada, virou-se e deparou-se com Jack. A respiração faltou-lhe e ela encarou-o estática, sem saber como proceder. Tinha medo até de se mexer. Agora que o ritual estava findado, todo o poder havia saído de seu corpo e ela se sentia a menina sem graça de sempre, ridícula naquele vestido negro e antiquado.
Ele olhava-a como se nunca a tivesse visto. Viu um sorriso começar a se esboçar naqueles lábios que ela tanto amava. Seu coração acalmou-se um pouco. Sentiu-se derreter quando ouviu suas palavras:
- Você fica ainda mais bonita quando está repleta pelo poder da Deusa.
- Há quanto tempo você está aí?
- Estou aqui a noite toda, estava te esperando.
- Agora me sinto uma tola, você viu meu ritual? - ela disse, abaixando os olhos e sentindo a face corar.
- Sim, e não há porque se sentir mal. - Ele aproximou-se segurando-lhe o queixo e erguendo delicadamente seu rosto, até que estivessem se encarando novamente - Fico honrado por você ter feito um ritual apenas para me ter como seu consorte, mas realmente não havia necessidade. Eu já aceitei o cargo há muito tempo, você que não tinha olhos para ver isso.
- Mas, não entendo, e Mia?
- Mia não existe para mim, meus olhos são apenas para você, minha bruxinha linda.
Ela viu os lábios dele descendo sobre os dela e sentiu que seu coração ia explodir de alegria. Independente de ter tirado uma foto para comprovar que havia feito o ritual ou não naquele lugar isolado, ela havia saído com o melhor prêmio que poderia esperar daquela aposta, que não parecia mais tão idiota assim.
Fonte: http://goo.gl/sMMlh
http://goo.gl/hkU1y
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