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Matizes e Cores (A Guerreira e o Ogro - capítulo 2)

Posted by Marcinha on 26 de maio de 2013 06:00 in , , , , ,
Em pouco tempo o sol começou a se recolher fora da caverna, espalhando um azul profundo por todo o firmamento, graciosamente pincelado por nuvens matizadas de dourado e rosa.
Markka permanecia sentada à entrada da caverna já há algum tempo, contemplando o espetáculo que a natureza lhe oferecia. Nesses raros momentos ela conseguia atingir a calma, contemplando passivamente crepúsculos, tempestades, marés furiosas. Imersa nos sons, odores e belezas destes espetáculos naturais ela esquecia a si mesma, como se sua essência pudesse tocar de leve outra atmosfera, bem mais sublime que este mundo de atrocidades e desonra.
A guerreira se virou para observar o interior da caverna. O ogro recolhia alguns pertences, organizando o local que ele chamava de lar. Em seguida atiçou o fogo, a fim de aquecer a refeição para eles. Markka se aproximou da fogueira, acompanhando com o olhar seu anfitrião, que por fim lhe entregou uma cuia de caldo fumegante.
– Também gosto de ver o por do sol. – afirmou ele casualmente, e se sentou em seguida, levando a cuia à boca.
Markka o observava em silêncio, enquanto parecia concentrada na sopa. A cada momento aquele ogro a intrigava mais.
Pouco tempo depois o ogro se deitou, em uma segunda cama que havia ao redor da fogueira. Ele havia dito à guerreira que encerrava seu dia cedo, para que estivesse descansado e pronto para trabalhar assim que o dia clareasse.
A guerreira decidiu dormir assim que o ogro se deitou, tencionando acordar antes dele. Embora ela estivesse mais a vontade na presença dele, ele ainda era um ogro, e ela não se esqueceria do perigo que ele podia representar.


O dia seguinte chegou, mostrando um céu perfeitamente limpo. Markka se levantou de um salto quando, olhando à volta, percebeu que o ogro não estava.
Ela se aproximou da fogueira já quase extinta, e achou sobre a bancada um pedaço de pão torrado. Roendo o pão, ela se aproximou da entrada da caverna e lá permaneceu por um bom tempo, esperando a volta do ogro.
Zenthor não tardou a regressar, trazendo pequenas bolsas de couro cheias de ervas tenras e pequeninas frutas avermelhadas.
– Ainda bem que achou o pão. Precisei sair muito cedo. – disse o ogro enquanto passava pela guerreira na porta da caverna.
– O que é isso? – perguntou ela, mesmo com a boca cheia, para manter a conversa.
– Frutas que contem uma excelente pigmentação vermelha, e ervas suculentas que soltam uma espécie de... baba. Uso as ervas como aglutinante para a pigmentação vermelha. – explicava o ogro, enquanto esvaziava as bolsas –  Desse modo consigo uma tinta espessa e resistente. 
– O que vai pintar com isso? – indagou Markka, observando o ogro que começava a macerar as ervas.
– Estou construindo um veículo grande, o primeiro que faço para mim. Por ser meu, pretendo pintá-lo.
– Por quê?
– Para que fique bonito. E me deixe satisfeito. E orgulhoso. – respondeu o ogro.
– Hã... – ela se limitou a dizer.
O ogro a observou, sem deixar de macerar suas ervas. Ela, por sua vez, estava atenta ao modo como ele socava as plantas com um cilindro de madeira dentro de uma cuia larga, resultando em um salpicado verde que já soltava um líquido viscoso e transparente.
– Sou artesão, como lhe disse ontem. Fabrico carroças. – disse o ogro, enquanto ela o olhava – Gostaria de ver o meu trabalho?
A guerreira quase esboçou um leve sorriso, mas permaneceu sóbria. Sem dúvida ela havia ficado curiosa sobre o que ele fazia desde que ele se apresentara como artesão. A guerreira também possuía algum talento; e adorava criar coisas. Sua vida não era feita apenas de batalhas e sangue, ela admirava as invenções e as artes, e encontrava um enorme prazer em ver sair de suas mãos algo que não existia antes no mundo. Ela via a criação como algo extremamente prazeroso, e costumava dizer que entendia por que Deus fora tão insaciável na diversidade de sua criação.
– Posso levá-la até lá, se desejar. – continuou o ogro, já que ela nada dissera.
– Sim, eu gostaria de ver no que está trabalhando. – respondeu Markka, tentando não parecer ansiosa, mas por dentro a curiosidade a espetava como uma lança.

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(Nota da Autora: O primeiro capítulo desta saga pode ser lido clicando aqui .)

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5 comentários:

  1. Estou ADORANDO a história!
    A desenvoltura com que você escreve é muito boa, dá pra visualizar tudo muito bem, é ótimo!
    E estou ansiosa pela continuação!
    Estou adorando a relação da guerreira com o ogro, a forma como ela o admira mas ainda sente um pouco de medo dele, essa mistura de sentimentos é envolvente.

    o texto está perfeito, quero só dar um pitaco aqui ó, acho q não é bem um erro, mas dá pra melhorar, no meu ponto de vista.
    "Posso levá-la lá" acho que fica melhor se vc colocar ATÉ lá.
    Leva-la la ficou meio la-la-la rsrsrsrs entende?
    só um palpite

    Parabéns pelo texto

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  2. Obrigada, Denize! Tb estou amando escrever essa saga e... já tem capítulo 3 programado pra domingo que vem! :D
    Ah, vlw pelo toque, eu não tinha percebido, mas estava la-la-la mesmo, rss... já alterei, muito obrigada!

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  3. E a obra de arte continua! Tão perfeita quanto a primeira parte, senti agora uma descontração maior nos personagens...e adoro narrações onde duas pessoas estão se conhecendo e aprendendo uma sobre a outra sabe?
    Também estou ansiosa pela continuação, e me deu uma invejinha boa...daquelas que dá vontade de escrever uma série também! ^^

    Amei essa frase:

    "Ela via a criação como algo extremamente prazeroso, e costumava dizer que entendia por que Deus fora tão insaciável na diversidade de sua criação."

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  4. Show!
    Achei a ideia de como ele faz a tinta muito interessante.
    E como será a carroça que ele fabricou? Tcharã, tcharã! Não percam cenas do próximo capítulo, rsrs.
    Muito bom o texto, Marcinha! Tomara que domingo chegue logo,rs.

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  5. PQP Marcinha!
    O texto já começou de uma beleza do caramba! Rapaz... Adoro suas descrições e quanto mais leio, mais volto a ver a "escrita-arte" na nossa literatura. Adoro!

    O mais legal é que tanto um guerreiro(a) quanto um ogro(a) normalmente são seres extremamente mais brutalizados, mas não. Eles são pessoas que usam "máscaras". Querem se mostrar fortes para o mundo, mas possuem dentro de si, uma sensibilidade tocante.





    Trechos favoritos:
    "Imersa nos sons, odores e belezas destes espetáculos naturais ela esquecia a si mesma, como se sua essência pudesse tocar de leve outra atmosfera, bem mais sublime que este mundo de atrocidades e desonra."

    Nem preciso dizer o quanto amei a frase sobre a criação, porque a Paty, muito gentilmente já a citou anteriormente, mas o texto todo, está de uma delicadeza e beleza fascinantes!

    Quero muito conhecer mais Markka e Zenthor!

    Parabéns!

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