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Cocô
A noitada tinha sido boa, regada a bastante
churrasco e cerveja, não tinha uma noite como aquela há meses, desde que foi
afastado do trabalho para “preservar a sanidade”.
O garçom não aguentava os pedidos exigentes do
rapaz na mesa sete, que insistia.
— Me tragam mais picanha! Chefe, cadê o
coraçãosinho de frango? To com fome.
De repente uma vontade vem tão forte que varre
todas as outras do pensamento, uma vontade tão louca, tão indescritivelmente
urgente que ele teve que sair correndo da mesa até o banheiro. Precisava fazer
o numero dois da tabela, precisava fazer cocô.
Entrou rápido como um relâmpago no banheiro
masculino, dois caras que usavam o mictório olharam espantados quando ele bateu
a porta de uma das “casinhas de rei” ao entrar.
Ele arria as calças e senta no derradeiro trono,
tomando a posição solene do Pensador de Auguste Rodin começa a preparação para tirar
aquilo de dentro de si. Primeiro um teste de força, ao que parece o dito objeto
infame é grande demais para sair.
Ele respira fundo, segura aquele fôlego como se
fosse sua ultima inspiração, a testa apoiada no punho e o cotovelo no joelho,
ele começa a fazer força. A testa, as bochechas, o nariz, tudo começa a ficar
vermelho e suar.
O corpo todo começou a tremer quando aquela aberração
começou a sair, ele achou que já era força o suficiente e tentou pegar mais
fôlego para continuar e nessa parada tudo o que tinha saído tornou a entrar.
Inconformado ele quer ejetar aquele torpedo num único impulso, abraça os
joelhos e dobra a força empregada.
Tem que sair, afinal de algum jeito sairia.
Sai, sai, sai, sai de mim, pensava, sai monstro,
aliem, troço, sai.
Saiu.
Ele descansa o gozo dos justos, largado em cima da
privada como um boneco de pano, se sentindo um tanto abusado, mas aliviado.
Se limpa e ergue as calças, mas quando vai dar a
descarga resolve admirar a obra.
Repara em como é de um saudável verde-amarronzado,
no formato roliço e liso como se fosse de porcelana, boiando despreocupadamente
sobre a água, sem se preocupar com seu destino. Pobre criatura recém-nascida que
espera seu fim tranquilamente, sem saber nada do esgoto de cidade grande que há
lá fora. Sente pena daquela bolota de alimento digerido cujo único pecado era
ter que ir descarga abaixo.
É meu filho, ele pensa, tem o meu DNA, veio de
mim, foi por ele que sofri a dor do parto, dor de colocá-lo no mundo. Não posso
de maneira nenhuma jogá-lo no esgoto selvagem em que um cocô tão jovial como
ele seria estraçalhado junto com a diarreia alheia, não posso.
Aquele sentimento paternal o faz olhar
carinhosamente para o aprendiz de submarino boiando na privada, que parece
olhar de volta, suplicando para conhecer o mundo.
É com enorme tristeza que puxa a cordinha. Tinha que
compreender que eles crescem e querem conhecer o mundo de qualquer maneira, que
por mais que queira não podia manter ele por perto e o proteger pra sempre. Um
turbilhão de água arrasta o cocô pelo cano, é a ultima vez que o vê.
Desvia o olhar enxugando uma lágrima, aquilo ia
deixar uma cicatriz na alma, ou uma hemorroida em outra área.
3 comentários:
Caraca, pensei que o cara ia pagar pensão pro cocô, kkkk.
ResponderExcluirSó vc mesmo Balta pra contar a história de um cocô! kkkkkkkkkkkkkkkkkk
ResponderExcluirE cá pra nós, todo mundo dá uma olhadinha na obra antes de enviá-lo esgoto a baixo não é? Parece que precisamos saber formato, tamanho, quantidade, cor...senão parece que fica faltando alguma coisa, sei lá...
Filosofando sobre o cocô kkkkkkkkkkkkkkkkkk
Tem q ser o Balta mesmo pra ter essas idéias! rsrsrsrs Aja criatividade, e estômago pra escrever sobre um cocô né? rsrsrsrsrs
ResponderExcluirComenta aê!