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Sobre ser gordo (ou como é difícil almoçar com magros)

Posted by Kbeça on 31 de maio de 2012 14:25 in , , , , , ,


Uma das piores coisas de ser gordo é que você ou come muito, ou come muita besteira, ou os dois. No meu caso é os dois.

Há algum tempo estou trabalhando em Botafogo, zona sul do RJ. Para vocês terem uma ideia de como as coisas são caras por aqui, um suco com salgado, que normalmente eu pagaria em torno de R$ 3,00 a R$ 4,00 em uma pastelaria, eu paguei R$ 10,00 num lugar "barato" aqui.

Normalmente eu almoço com a estagiária que, apesar de compartilhar da minha tendência glutonica, ganha merreca, então vai em lugares baratos. Mas, ontem ela saiu com o marido e eu fiquei numa situação constrangedora quando o diretor de projetos me chamou para almoçar no lugar dela. Fazer o quê?! Lá fui eu.

Veja bem, nada contra o cara. Ele é até gente boa e tal, mas ele é diretor e eu sou analista, e estamos em Botafogo, baby. O Manuel Carlos grava novelas aqui. Vê lá se ele grava novelas no Méier, em Madureira, Bonsucesso. NÃO! Porque lá é terra de pobre.

Quando estávamos saindo falei:
- E ai, vamos num lugar bom, barato e bonito?
Ele riu. Isso não era um bom sinal.
- Bom e bonito, sim. Barato, nem tanto. - Disse ele.
- É a la carte? - Perguntei.
- Não, não. É à peso mesmo. Sai mais barato.
Mais barato para quem? A Nanda tem uma regra: se ela estiver pagando, eu não posso comer à peso. Ela não é mão de vaca, tadinha. É que eu levo essa coisa de peso à sério e acabo querendo colocar o meu próprio peso no prato. Aí já viu, né?!

Mas, beleza. Continuamos andando. O meu desespero foi aumentando quando as casas mais humildes e os prédios comerciais foram diminuindo e foram surgindo altos casarões e condomínios fechados. A cada passo eu ia tentando somar o que eu tinha nos bolsos, na carteira, na conta, e analisando se eu estava em condições de correr. Sabe como é, diz que vai no banheiro e só pára de correr quando estiver em casa.

Chegamos. O lugar tinha até segurança de terno e com fone de ouvido, na porta. Aquela bagaça devia ser protegida pela CIA. Só entrava gente engravatada naquela porra e eu estava de jeans. Logo na porta o menu e o preço do kilo, R$ 41,90. Quando eu vi o preço meus olhos arregalaram e eu pensei "Tôfudido! A Nanda vai me matar!"

Entramos e fomos direto para o buffet e eu ficava entoando mentalmente um mantra enquanto nós colocávamos a comida no prato:

Coloca pouco, seu gordo pobre.
Coloca pouco, senão a porra vai ficar séria..
Coloca pouco, seu gordo pobre.
Coloca pouco, que tu não tem dinheiro e não consegue correr mais que os seguranças.
Coloca pouco, seu gordo pobre.
Magro dos infernos. Olha lá: saladinha, alfacezinho, tomatinho. Por isso o puto come aqui e fala que é barato.
Coloca pouco, seu gordo pobre.
Ih, fudeu-se tudo! Camarão! Amo camarão!
Coloca pouco, gordo lazarento. Tua mulher vai arrancar as tuas bolas!

E assim, fui colocando pouco. Para meu alívio, o restaurante era para corsas, porque tinha mais mato do que comida. Muita salada, verde, mato, suflês, mais mato, sementes disso, sementes daquilo, mato de novo, broto de alguma coisa, e por aí vai.

Pesamos! Agora já era. Eu devo ter suspirado alto quando meu prato marcou 500g, porque a funcionária riu e uma senhora, muito bem vestida, ao meu lado, ficou me encarando. Eu ainda não entendi se o olhar dela para mim era pensando "o que esse gordo tá fazendo aqui", ou se ela estava tentando decidir se me dava uns R$ 50,00, ou não. Enfim.

Quando finalmente sentamos para comer ele olha para a minha nota e fala:
- Aí, viu?! Baratinho. R$ 22,00.
Perai, seu gambá assanhado! Meu ticket é de R$ 15,00, eu como um PF de R$ 16,00 e racho com a estagiária para sair mais barato, tô passando fome aqui e tu ainda vem tirar sarro da minha cara falando que tá baratinho?! Juro que me deu vontade de falar isso, mas o que eu falei foi:
- É... (com a fome que eu estava não saiu muito alto)
A garçonete parou do meu lado e perguntou o que eu queria beber.
- Coca, por favor. - respondi.
- Você devia beber algo mais saudável.
Olhei bem para a cara dele... respirei... respirei de novo... e fingi que estava orando.
A menina já chegou colocando o refrigerante no meu copo e eu já fui bebendo. Em seguida ela escreveu na minha nota o valor: R$ 4,00. PUORRANN!!! R$ 4,00 por uma latinha, eu quase regurgitei o troço de volta na lata. Eu pago menos que isso em uma de Coca de 3L.

Resumindo foi isso: comi, quase chorando, o meu "meio-quilo", pagamos e fomos embora.

Quando eu contei isso para o marido da estagiária, que me acompanha na dimensão da circunferência da cintura, ele falou:
- Ah, cara. Quando for assim, vai só para acompanhar. Come duas folhas de alface e, quando sair, fala que tem que ir no banco e corre pro china e pede uns salgados com caldo de cana.
Ele é gordo a mais tempo que eu e mora aqui em Botafogo. Tem mais know how no assunto. XD

E vocês acham que gordo não sofre.

Um dia desses eu conto como é na academia.

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6 comentários:

  1. Kbça, vc é hilário, já cansou de acontecer comigo de almoçar no comida a kilo e não saber se o dinheiro dava pra pagar,kkkkkk. Ser gordo é mesmo um karma que temos de carregar. Muito bom mesmo!

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  2. Digno de um texto do Luiz Fernando Veríssimo, mandou bem muzim!

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  3. Amei Kbeça!!!! Ri demais! Fiquei imaginando aqui as caras e bocas que vc fez e ria mais ainda.
    Muito show. Vou esperar a da academia. Vê se faz logo hem?

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  4. hauhauhauhauhauhauhauhauhua
    Kraca, Kbeça! Eu ADOREI! Ri alto aqui em casa!. Que delícia de texto!
    Melhorou até meu humor!

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  5. Muito obrigado, meninas.
    Muito obrigado.

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  6. Não se preocupe KBeça, tamo junto nessa aí. Aqui em casa não está nada fácil conseguir perder uns centimetros da horizontal, o menu é pizza, macarrão ao molho de strogonoff, panqueca recheada, e se Deus ajudar vai ter esfirra, tudo caseiro. E sim, também odeio almoçar por quilo, eu como em média 2k, imagina eu nesse lugar daí, ia à falência.

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